Martelar com a Água

GP

Gilberto Pereira

Museu da Ciência da Universidade de Coimbra

Imaginem um pequeno tubo de vidro, completamente fechado e com duas pequenas protuberâncias arredondadas. No seu interior alguma água, sob vácuo. Girando rapidamente o tubo, a água nele contida cai. Ouvimos um estrondo. Um som seco. Como se fosse um bloco de ferro sólido a cair redondamente no chão. Voltamos a rodar e ouvimos o mesmo martelar. No século dezoito este som era explicado pela solidez e dureza das partículas da água, tal como defendeu Teodoro de Almeida, na sua obra “Cartas Fisico-Mathematicas de Theodosio a Eugenio”. O martelo hidráulico ou martelo de água, assim designado nos antigos manuais de Física:

“O martelo hidráulico é um canudo de vidro, (...). Quando se forma, se lhe introduz água e se evacua de ar, fechando-o nesse tempo hermeticamente, (...) sucede que, voltando de sorte o tubo, que a água cai de pancada (…), dá um golpe com um sonido como se fora um pedaço de ferro, que caísse na extremidade (...) do tubo. De sorte que os charlatães dizem que ali há ferro ou pedra que se não vê. A explicação deste fenómeno é fácil nos princípios, que tenho dito; porque sendo a água composta de partículas duríssimas, como o ferro, caindo de golpe sobre o vidro, deve fazer o mesmo sonido do que ele. Se o tubo tivesse ar, não se ouviria o tal golpe; porque as partículas sólidas não caiam todas juntas no vidro e; mas achavam lá uma como almofada das partículas de ar, que amorteceriam o golpe; porém como o ar se tirou, toda a massa de água cai de golpe no vidro, e não sendo a água, se não um ajuntamento de partículas sólidas, duras e firmes, como o ferro, dão o golpe, como se fosse ferro. Já me sucedeu quebrar algum destes tubos com a pancada, que ali dava a água (…).” Teodoro de Almeida, págs. 5-6.

Na coleção do século XVIII do Gabinete de Física da Universidade de Coimbra estavam inventariados 6 martelos de água, os quais, pela sua fragilidade e uso, não chegaram à atualidade. O único exemplar existente terá sido incorporado após 1851.