/ Caminhos na UC

Episódio #48 com Teresa Girão

Percorrer vários caminhos e abrir a porta a diversas áreas em busca da realização profissional

A ligação de Teresa Girão à Universidade de Coimbra (UC) começou antes de ingressar na instituição enquanto estudante. Teve início quando fazia pesquisas para trabalhos da escola, um deles, curiosamente, sobre a área que viria a escolher para exercer a sua atividade profissional: a Ciência. A atual diretora do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra (JBUC) fez a sua formação inicial em Bioquímica, seguindo depois caminho nas áreas da Biotecnologia e das Neurociências, mantendo sempre a porta aberta para conhecer novas áreas de trabalho. E acabou por ser essa curiosidade, misturada com o gosto por novos desafios, que marcou o seu regresso a Portugal, depois de uma temporada fora, para se dedicar à Comunicação de Ciência. No caminho de Teresa Girão, as idas e vindas tornaram possível a consolidação de um percurso profissional que lhe permite hoje conduzir o destino de um espaço tão emblemático da Universidade de Coimbra, casa de mais de 1 500 espécies de plantas e lugar de descanso, de passeio, de estudo e de trabalho.

Quando e como começou o seu percurso na Universidade de Coimbra?

Entrei na Universidade de Coimbra há quase 30 anos, no ano letivo 1993/1994, como estudante de Bioquímica. Até essa altura, o meu caminho na UC tinha passado apenas pela Biblioteca Geral, a fazer umas pesquisas para trabalhos da escola, curiosamente alguns na área da História da Ciência.

Fez a sua formação académica em Bioquímica. Como é que surge o interesse pela área?

Talvez de uma forma muito ingénua e simples, como são as escolhas que se fazem na altura do ingresso no ensino superior, com a informação que se tem. Gostava muito de Biologia e de Química e lembro-me de ter ido ao Fórum Estudante, em 1992, na FIL, em Lisboa, e de ter recolhido todas as brochuras sobre cursos nestas duas áreas em todas as universidades do país. Depois disso, procurei perceber o que me interessava mais. E, naquela altura, qual era o curso que equilibrava melhor a Biologia e a Química? Era o que curso de Bioquímica aqui em Coimbra, que tinha realmente quase iguais componentes destas duas áreas.

Depois dos primeiros anos de formação, o caminho começou a ser mais dirigido, como acontece com qualquer estudante em formação pós-graduada, que vai escolhendo o percurso de acordo com as áreas que mais gosta dentro deste campo imenso das Biociências, em que a Bioquímica se integra. No meu caso, acabei por escolher uma área mais ligada à Biotecnologia. Acho que foi o primeiro passo para o lado relativamente ao que rumo que escolhi quando ingressei no ensino superior. Mas, na verdade, o conhecimento da Bioquímica foi essencial não só para as escolhas que fiz, mas para cimentar os conhecimentos que precisava para continuar a estudar.

A Comunicação de Ciência foi também um passo para o lado, passando a ocupar espaço no seu percurso?

Essa descrição é uma boa imagem: a Comunicação de Ciência foi ocupando espaço na minha vida. Não foi uma escolha óbvia. E esta ligação começou com o meu doutoramento. Fiz o doutoramento na área da Biotecnologia e das Neurociências no Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra (CNC-UC). Já nessa altura, o CNC-UC era muito ativo em atividades de promoção de ciência, mais dedicadas a jovens em idade escolar. E nós, estudantes que estavam nos laboratórios a fazer a sua investigação, éramos desafiados a participar nessas atividades. E lá estava eu, sempre a envolver-me e a participar. Foi assim que comecei não só a sentir o entusiasmo de participar nas atividades, mas também a ter uma perceção da importância do movimento da Comunicação de Ciência e da literacia científica para a sociedade em geral.

Fui absorvendo muito este entusiasmo da comunicação com diferentes públicos. E comecei também a perceber a necessidade de formação nesta área, que não existia e, portanto, enquanto estudantes não tínhamos contacto com este mundo, apenas quando estávamos no “terreno”, a trabalhar em laboratório. Hoje em dia, essa formação já existe, mas há necessidade de uma maior aposta na formação pós-graduada nesta área.

Apesar de todo este entusiasmo, não foi, ainda assim, uma mudança imediata de área de trabalho. Depois de terminar o doutoramento, saí de Portugal e continuei a minha investigação na área das Neurociências. O regresso ao país já foi planeado exatamente para fazer esta mudança de área profissional, não tanto por ter deixado de gostar do que fazia, mas, na verdade, por ter de optar por um dos caminhos. Já não era viável estar em duas áreas em simultâneo. E, mais do que isso, queria procurar um caminho em que julgava que seria melhor. Hoje estou consciente que foi uma boa aposta.

Gostaria de frisar que não há mal nenhum em seguirmos novos caminhos, que aparentam ser diferentes da formação inicial; especialmente porque, como foi o meu caso, a formação base e pós-graduada em Biociências foi essencial para conhecer o meio universitário e a investigação que se faz em Portugal e no mundo. Conhecer o meio também permite fazer melhor a atividade que escolhi como principal: a Comunicação de Ciência.

Atualmente, é diretora do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. Como é cuidar, todos os dias, de um lugar com quase 12 hectares?

São quase 12 hectares de muito trabalho. Maioritariamente, as pessoas conhecem 1/3 deste espaço, ao qual chamamos habitualmente Jardim Clássico, mas o JBUC tem também o Arboreto (ou Mata, como habitualmente é designado). E como é que se cuida deste espaço? Com muita organização de uma pequena equipa, que consegue manter e melhorar este espaço, sempre com muita dedicação!

Posso dizer que tenho o orgulho de trabalhar com uma equipa empenhada com a missão e com a importância que o Jardim Botânico tem, quer para a comunidade UC, que o reconhece como seu, quer para a cidade, como para todos os que o atravessam e visitam. Há um grande brio nesta equipa que cuida do Jardim Botânico.

Cuidar deste espaço é um desafio permanente. O telefone (que agora está, obviamente, em modo silêncio) não para de tocar porque estão sempre a acontecer coisas e é necessário dar indicações. A qualquer momento, pode acontecer alguma situação que nunca tinha acontecido antes. E isso não é um problema, porque nós sabemos que este trabalho é assim mesmo. É, possivelmente, o trabalho mais difícil e mais desafiante que já tive, mas o melhor também.

Quando lhe propuseram o desafio de dirigir o Jardim Botânico, teve receio de aceitar?

Imenso!

E como fez frente a esse receio?

Levando a bola para a frente, que é o que habitualmente faço. Alguma coisa estava mal se achasse que tudo seria fácil, que não é. Ter consciência da importância e da dificuldade de um determinado trabalho mantém-nos sempre alerta para os problemas que podem surgir e para as dificuldades da função. E como se lida com tudo isto? Aprendendo, essencialmente com as pessoas que estão no JBUC há muitos anos e que conhecem melhor que ninguém o Jardim.

Claro que eu já tinha a vantagem de ter cá estado a trabalhar com um anterior diretor, o Doutor António Gouveia, e de ter aprendido muito. Costumo dizer que, nessa altura, parecia um miúdo de cinco anos, por constantemente perguntar “o que é isto?”, “e isto?”. Aprendi muito nessa altura, mas estava apenas a fazer a gestão de um projeto, muito diferente da responsabilidade e da enormidade de questões com que lido diariamente neste momento. É uma aprendizagem permanente. E nunca devemos ter medo de aprender coisas novas, de recorrer às ferramentas existentes e às pessoas que estão à nossa beira para fazer melhor o nosso trabalho.

O que a motiva para estar aqui todos os dias a conduzir o JBUC?

Este é o melhor sítio para se trabalhar. Nós dizemos isto e parece uma graça, mas não é. Já sentia isto antes: o JBUC é um espaço privilegiado para trabalhar. E a importância do Jardim Botânico para a Universidade, e para toda a comunidade, fazem com que este trabalho valha a pena, todos os dias. É inegável o quão fantástico é estar neste ambiente.

Os desafios existem em qualquer local de trabalho e são todos diferentes. E neste espaço temos a enorme vantagem de ser um espaço belíssimo e vastíssimo, que nos permite fazer trabalhos tão variados como a sensibilização para a importância da biodiversidade e da proteção ambiental, trazer eventos culturais, chamar pessoas dos mais diferentes quadrantes, áreas de trabalho ou de formação para o JBUC. Todos os dias são diferentes, e isso é estímulo suficiente.

Que mensagem gostaria de deixar à comunidade UC?

Que continue a preservar este espaço, que é seu. Este é um espaço muito bem cuidado e acarinhado pelas pessoas. Continuem a fazê-lo. E sirvam também de embaixadores do Jardim Botânico, e da Universidade de Coimbra em geral, porque não há ninguém melhor do que nós, que conhecemos este nosso espaço, esta nossa casa, para o promover junto dos outros.

Produção e Edição de Conteúdos: Catarina Ribeiro, DCOM e Inês Coelho, DCOM

Imagem e Edição de Vídeo: Ana Bartolomeu, DCOM e Marta Costa, DCOM

Edição de Imagem: Sara Baptista, NMAR

Publicado a 20.04.2023