/ Caminhos na UC

Episódio #28 com José Miguel Nunes

Ajudar a criar novas pontes entre estudantes e diplomadas/os da Universidade de Coimbra e o mercado de trabalho

Chegou à Universidade de Coimbra com 17 anos, para estudar Sociologia. Corria o ano de 1991 e, nessa altura, José Miguel Nunes não imaginava que voltaria à sua alma mater enquanto trabalhador. Mas foi esse o caminho que se traçou quando, em 2004, regressou à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) como colaborador. Hoje continua a trabalhar na Universidade de Coimbra (UC), onde desempenha funções como técnico superior do Núcleo de Promoção da Empregabilidade (NUPE), prestando apoio a estudantes e diplomadas/os da Universidade para que encontrem o seu rumo profissional depois de terminada a formação académica.

Quando e como começou o seu percurso na Universidade de Coimbra?

Tenho o momento formal, que é quando me torno estudante da Universidade de Coimbra, em 1991. Tinha estudado sempre em Coimbra. Sou de Coimbra e sempre cá vivi, o que também quer dizer que a minha ligação à Universidade, inevitavelmente, já tinha acontecido. A Universidade, de alguma forma, sempre esteve presente em mim. Para qualquer pessoa de Coimbra, a Universidade é algo que marca. Tenho memórias da Universidade de Coimbra desde sempre, mas a entrada aconteceu quando fui estudar para a Faculdade de Economia, para a licenciatura em Sociologia.

Por que motivo escolheu estudar Sociologia?

Curiosamente, de vez em quando faço esse exercício de pensar no motivo. E, em boa verdade, até hoje (e acho que com a passagem dos anos mais difícil se torna ter uma ideia melhor) não consigo ter uma perspetiva de ter sido uma decisão muito convicta. Talvez por ser muito novo ou porque na altura os apoios que havia em termos de aconselhamento e de orientação vocacional eram poucos ou pelo pouco acesso à internet, eu não tinha assim tantas fontes de informação e acho que foi um bocadinho por exclusão de partes.

Estava na área das Ciências Sociais e Humanas e, naturalmente, havia algumas possibilidades, sendo que o Direito não me interessava muito, pois não se enquadrava no meu perfil. O meu perfil estava mais orientado para a área da História, mas a Sociologia aparece porque, em conjunto com um ou outro colega, acabámos por pesquisar um pouco sobre a área. E percebemos que, dentro daquilo que nos despertava mais interesse, a Sociologia fazia sentido porque era das Ciências que nos permitia, de alguma forma, sermos curiosos e exercitarmos essa curiosidade de uma forma também aplicada. A formação em Sociologia acaba por nos levar para aí. Acho que nos transforma enquanto pessoas e cidadãos. E do ponto de vista técnico, à partida, o que se pretende é que um sociólogo seja um questionador. Percebi que esta área de formação poderia ser interessante, e também com a ingenuidade de não ter capacidade de aprofundar mais os possíveis caminhos a seguir, foi uma decisão por exclusão de partes, mas muito realizada.

Como é que ingressa na Universidade de Coimbra como trabalhador?

Estava a trabalhar desde 1998 na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC). Também uma estrutura da Administração Pública, onde as minhas tarefas passavam pela gestão de alguns projetos de cooperação internacional, nas quais ia tendo algum contacto com professores e investigadores da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, a minha alma mater. Em 2004, uma colega (que ainda está na UC, porque, entretanto, regressou) estava de saída da FEUC e, na altura, as pessoas que estavam na direção da Faculdade conheciam-me relativamente bem e achavam que, de alguma forma, eu tinha um perfil que se enquadrava no tipo de pessoa que eles iriam precisar para substituir temporariamente a colega que estava de saída. E foi assim que, em 2004, por convite, me foi lançado esse desafio.

Em boa verdade, era a primeira vez que estava a ter oportunidade de, por minha decisão, sair de onde estava e ir profissionalmente para outro local. E isso levantou muitas dúvidas e muitos receios. Mas, por outro lado, estava a voltar a uma casa que conhecia bem. Tinha estudado na FEUC durante cinco anos (fiz uma licenciatura de cinco anos) e, quando saí de lá, longe de mim perspetivar que pudesse um dia voltar. Mas também por isso acabou por ser mais fácil, porque estava a voltar a uma casa que conhecia bem e de onde tinha saído com muito boas recordações.

Já passou por vários locais de trabalho na UC e está, desde 2020, no Núcleo de Promoção da Empregabilidade. Como é que tem sido a experiência neste serviço?

Tem sido muito interessante. Nos anos em que estive na Faculdade de Economia a trabalhar, muitas das funções que desempenhei já passavam também pela área das saídas profissionais e dos estágios curriculares. Entre outras coisas, estava também no apoio aos órgãos de gestão, nas relações externas e visitas às escolas, mas, de facto, a parte dos estágios e do contacto com as empresas eram uma parte importante do meu trabalho. Depois, saí em 2012 da Faculdade de Economia e regresso mais tarde à UC. E quase por coincidência – através de um concurso onde, num primeiro momento, fiquei na reserva de recrutamento – acabo por ser chamado e convidado para vir para o Núcleo de Promoção da Empregabilidade porque, de facto, também estava a ser necessária uma pessoa. Houve aqui um match porque terão percebido que já tinha estado a trabalhar um pouco nessa área. E esta foi a oportunidade de voltar a fazer um pouco o mesmo, agora numa perspetiva mais abrangente, porque no NUPE (que antes era o Gabinete de Saídas Profissionais) estamos a trabalhar ao nível central, para todos os estudantes e para todos os diplomados da Universidade de Coimbra, mas procurando sempre uma grande articulação com as Unidades Orgânicas, o que é muito importante e torna todo o trabalho mais eficaz. Por parte da atual equipa reitoral tem havido a intenção de tentar fomentar esta área junto das Unidades Orgânicas para que, de forma articulada, consigamos ter maior impacto e maior proximidade dos estudantes. Além das Faculdades, os Núcleos de Estudantes são também um parceiro muito importante do NUPE.

O que é que faz habitualmente na sua rotina de trabalho?

Uma das coisas que acho particularmente interessante é que a nossa atividade, no NUPE, é pouco rotineira. Isto porque acabamos por ter contactos muito diversificados com todo o tipo de entidades potencialmente recrutadoras, desde as mais tradicionais, mas também da Administração Pública ou de projetos de empreendedores. Temos interações muito diversificadas.

Trabalhamos muito, obviamente, com estudantes e diplomados, que são o nosso público-alvo, e em articulação com as Faculdades. Fazemos atividades muito diversificadas e posso referir, de forma muito telegráfica, as principais. Gerimos o Programa de Estágios de Verão, que acho que é muito importante e que tem uma dimensão muito grande. Os estágios decorrem normalmente entre maio e outubro, mas o trabalho estende-se ao longo de todo o ano, porque há sempre um trabalho de preparação e análise, desde as candidaturas, passando pela fase de seriação dos candidatos, até à avaliação após o estágio.

Gerimos também o portal de emprego da Universidade de Coimbra (chamado Portal de Emprego UC | Job Teaser) e fazemos o match entre as ofertas do mercado de trabalho e a procura por parte dos estudantes e dos diplomados.

Temos também um protocolo muito importante e muito interessante com a Randstad, que é o Improve Yourself, através do qual conseguimos, por exemplo, fazer aconselhamento de carreira. Qualquer estudante ou diplomado pode recorrer ao Núcleo de Promoção da Empregabilidade para fazer o curriculum vitae ou a sua revisão, a construção de perfil no LinkedIn, a preparação para uma entrevista de emprego ou até para ajudar, numa lógica de mentoria, a perceber melhor o percurso ou para a preparação para determinadas áreas de especialização. E é assim que vamos ajudando os estudantes a prepararem-se melhor para o mercado de trabalho, como também a decidirem o que gostariam de fazer profissionalmente.

Fazemos também outras coisas no NUPE, como a gestão da informação. Diariamente, recebemos muitos telefonemas e e-mails através dos quais vamos recebendo propostas às quais precisamos de dar o melhor seguimento. E, perante este cenário, no Núcleo somos uma espécie de catalisadores da informação e temos a responsabilidade de ser a interface entre as empresas, as Faculdades e os estudantes/diplomados. E este é um trabalho muito interessante, porque nos obriga a ter uma perspetiva muito panorâmica de toda a instituição e a conseguir potenciar o contacto entre as empresas e a Universidade, contacto esse que pode resultar numa parceria, na assinatura de um protocolo, na realização de uma sessão de apresentação ou num recrutamento.

Em resumo, no NUPE desenvolvemos um vasto conjunto de atividades e de eventos que acaba por nos dispersar, mas que, ao mesmo tempo, não nos permite ficar fatigados ou aborrecidos, porque em cada dia há sempre novas interações com pessoas e com empresas. E essa é, talvez, uma das coisas mais interessantes de trabalhar nesta área.

Quais é que são as maiores recompensas do trabalho que desenvolve?

De uma maneira um bocadinho em abstrato, sem referir propriamente uma coisa em concreto, diria que gosto muito de ter a sensação de que em pequenas coisas conseguimos ter um impacto na vida do estudante ou do diplomado. Por exemplo, um estudante que chega até nós com muitas dúvidas e muitos receios, que se sente perdido porque precisa de tomar decisões e não consegue, que precisa de saber onde deve pesquisar empregos, o que mais me satisfaz e me deixa mais realizado nestas situações é ter a sensibilidade para conseguir interpretar as referidas dificuldades, desmistificar os problemas, converter a dificuldade numa solução e perceber que o estudante sai deste contacto connosco agradecido porque se sente bem informado e apoiado. Diria que essa é a parte que me deixa muito realizado, ao perceber que, mesmo em coisas simples, conseguimos ter alguma eficácia junto dos nossos estudantes e diplomados. Como trabalhamos para mais de 25 000 estudantes e quase 3 500 diplomados por ano, não conseguimos fazer isto de forma personalizada para todos. Mas se conseguirmos fazer para alguns, e ter impacto na vida de alguns, já estamos a realizar o nosso desejo e a cumprir a nossa função.

Desde 2019, é membro do Senado da UC, representando os trabalhadores não docentes e não investigadores. Qual é para si a importância deste cargo?

É muito importante. Hoje dou, claramente, muito mais valor e consigo ter uma perspetiva da instituição e uma capacidade de perceber as coisas com outra profundidade e com outra densidade. Mas, para ser sincero, acho que foi também algo quase circunstancial que me trouxe ao Senado. Sem fazer uma história muito detalhada, posso dizer que, quando em 2019 tive a oportunidade de ir pela primeira vez para o Senado, fui como suplente (substituindo a colega efetiva, a Fernanda Pereira, que tinha sido eleita e que me tinha convidado para entrar na lista) e fi-lo sem grande convicção e sem nenhuma expectativa de que tivesse a oportunidade – ou até a necessidade – de a substituir. Confesso que foi uma surpresa. Fiquei até muito atrapalhado, porque achava que isso nunca iria acontecer, ou quanto muito poderia ir assistir pontualmente a algumas reuniões do Senado.

Entretanto, em 2020/2021, nas últimas eleições, aí já me candidatei e fui o primeiro candidato efetivo de um projeto diferente, preparado conjuntamente com outros colegas e a par de uma lista para o Conselho Geral. E, de facto, o desafio é muito grande. E sinto-o como uma grande responsabilidade. E quando se tem esta responsabilidade (e isto não é uma falsa modéstia) numa instituição como a Universidade de Coimbra, estas coisas pesam um pouco. Nós sabemos a quantidade e a diversidade de pessoas que representamos e também a complexidade dos assuntos numa instituição com a grandeza e a grandiosidade da UC.

Tenho a convicção de que faço o meu melhor, com as minhas capacidades. Desse ponto de vista, sinto-me realizado e de consciência muito tranquila, porque acho que o faço de uma forma honesta. Mas, ao mesmo tempo, também sinto que há muitos colegas que poderiam fazer melhor do que eu faço. E espero que nas próximas eleições haja outra pessoa, porque acho que não nos devemos eternizar nestas funções. Já estou no Senado há algum tempo e gostaria de apoiar alguém que tivesse interesse em fazer parte deste órgão. É um trabalho muito digno e acho que é uma experiência muito interessante, que vale a pena.

Quais foram os momentos que mais marcaram o seu percurso na Universidade de Coimbra?

Fazendo uma retrospetiva, claramente que a entrada novamente para a Faculdade de Economia. Para mim foi um momento marcante, porque regressei a uma casa como funcionário (e, na altura, até fui assumir a responsabilidade de um serviço) quando tinha saído há alguns anos como estudante. Foi um momento marcante e encheu-me de muito orgulho.

Depois houve um momento que foi muito triste para mim, que foi quando tive que sair. Em 2012, tive que sair porque estava numa situação relativamente precária, a contrato com termo. Na altura, concorri a uma vaga, mas acabei por não ficar e tive que sair da Faculdade de Economia. E para ser sincero, acho que até hoje não sei se recuperei bem disso, porque foi um desgosto muito grande. Adorava trabalhar na FEUC e era muito feliz a trabalhar lá. Tenho a consciência de que este momento me marcou muito negativamente.

Depois disso, fiquei desempregado, fui fazer outras coisas e depois, em 2014, tive um convite, que me honrou muito também, por parte da Vice-Reitora Margarida Mano, para colaborar num projeto que ela tinha na Reitoria, na área social. Ela sabia que eu tinha algum know-how naquela área. E vim trabalhar novamente na UC. E foi um momento marcante também, a vários níveis. Em primeiro lugar, porque foi um regresso à Universidade, sítio onde tinha sido feliz por várias vezes, enquanto estudante e enquanto funcionário. E depois porque, além de ter corrido bem a colaboração no projeto que mencionei, foi nessa altura que consegui ir a um concurso, onde fiquei em reserva de recrutamento, e em 2015 sou chamado e acabo por ingressar por tempo indeterminado na UC. Isso também foi marcante, mesmo que só a posteriori é que tenha percebido que se calhar se não tivesse vindo em 2014 para um projeto, ainda que a recibos verdes, não tinha tido esta oportunidade de ir a um concurso e de ingressar de forma definitiva na Universidade. E a partir daí tem sido um caminho com novos desafios, dinâmicas e responsabilidades. Um caminho, claramente, com mais pontos altos do que baixos.

Para terminar esta conversa, e tendo em conta que atua na área da empregabilidade, que conselho daria aos/às estudantes da UC sobre o ingresso no mercado de trabalho após a formação?

Gostaria de ressalvar que, do ponto de vista técnico e profissional, eu não sou propriamente um conselheiro de carreira. Sou uma pessoa com um background em Sociologia, que, passe a imodéstia, tem algumas competências em algumas áreas, nomeadamente na organização de eventos, na gestão de informação, na comunicação, um pouco por aí. E, ao fazer este trabalho, vamos ganhando algum conhecimento e algum know-how que nos permitem dar algumas dicas, mesmo que com menor rigor técnico. Por isso, sem ser muito rigoroso do ponto de vista técnico e de forma sucinta, diria que, hoje em dia, a preparação para o mercado de trabalho é um processo muito sistemático, que deve ser muito organizado e muito construído.

O que é que quero dizer com isto? Se há 15, 20, 30 anos claramente um jovem diplomado – de maneira geral e mesmo em áreas menos óbvias – poderia preparar-se para a empregabilidade apenas na fase final da sua formação (muitas vezes, construía-se o currículo quando se estava mesmo a terminar o curso), hoje em dia, claramente, isso é impossível. Poderia mencionar uma ou outra área em que isso ainda pode acontecer, mas isso não faz grande sentido. O desafio é que os estudantes, desde muito cedo – muitas vezes, até antes do ensino superior, mas claramente desde que chegam à universidade – tenham consciência que a sua empregabilidade é um processo evolutivo e construtivo. Isto significa que devem ir fazendo algumas atividades e aproveitando as dinâmicas que a instituição vai permitindo.

O caso da Universidade de Coimbra é muito exemplar a esse nível, porque na UC (sem desfazer, claro, outras instituições) os estudantes encontram algumas portas que são praticamente únicas, desde logo ao nível do associativismo. Um estudante da UC pode ter um conjunto de experiências ao longo da sua formação, não só na Associação Académica de Coimbra e aos níveis cultural e desportivo, mas também através da mobilidade, de estágios, da participação nas múltiplas iniciativas que vão acontecendo na UC. Hoje em dia, tudo isso é muito valorativo do currículo. E se os estudantes tiverem desde cedo essa consciência podem ir-se preparando ao longo do tempo, não ficando restritos à sua formação académica, tentando conciliar tudo. E se conseguirem construir um CV através das outras iniciativas vão perceber, quando terminarem a sua formação, que uma grande parte do curriculum vitae está construído. É importante ter isto em conta o mais cedo possível, aproveitando as oportunidades que vão surgindo e procurando conciliar a parte académica com outras atividades. E o Núcleo de Promoção da Empregabilidade também está aqui para ajudar.

Produção e Edição de Conteúdos: Catarina Ribeiro, DCOM e Inês Coelho, DCOM

Imagem e Edição de Vídeo: Marta Costa, DCOM

Edição de Imagem: Sara Baptista, NMAR

Publicado a 05.05.2022